Em Myanmar as tropas aproveitam os meninos mais vulneráveis para a vida dura do exército.
Win Sein, o adolescente e ex-soldado de cabelos espetados disse que se lembra perfeitamente do dia em que tropas de Myanmar o apanharam nas ruas de Mandalay.
Acusaram-no de roubar e forçaram-no a se tornar uma criança-soldado. "Disseram-me que ou ia para a cadeia ou juntava-me ao exército. Disse-lhes que não queria entrar e só pararam de me bater quando concordei".
Disse-nos ser um sem-abrigo e ter cerca de 15 anos, não sabendo a sua data de nascimento.
Após quatro meses de acampamento, envolvendo um regime de exercícios fatigante, treino com armas e castigos corporais, o jovem disse ter sido enviado para a linha de frente da guerra civil contra os rebeldes étnicos, em regiões remotas da selva.
Um ano depois, Sein Win fugiu escapando do país governado por militares, chegando à cidade fronteiriça tailandesa de Mae Sot.
"A razão principal não foi a guerra, mas sim porque os sargentos eram muito, muito violentos, sempre insultando e batendo nas crianças-soldado”. "Então decidi fugir, acontecesse o que acontecesse".
Sein Win, está agora sob os cuidados de Mae Sot um grupo de ajuda baseado em Acção Social para as Mulheres (SAW), onde inicialmente foi relutante em contar sua experiência angustiante.
“Quando ele chegou ao grupo de ajuda, esteve prestes a perder o controle. Partiu garrafas de vidro e cortou o braço", disse o director do SAW "Não falava e não respondia a quaisquer pergunta que fizessemos”. “Não confiava em ninguém e carregava os danos psicológicos típicos de jovens que passaram algum tempo no exército” acrescentou o director, que já cuidou de cerca de 20 crianças-soldados de Myanmar.
Sein Win disse que as crianças do seu acampamento tinham sido forçadas a dizer ao tenente do exército que se tinham alistado voluntariamente, porque tinham medo dos sargentos que os tinham recrutado e mentido sobre as suas idades.
O alistamento de menores é proibido por lei em Myanmar.
O alistamento de menores é proibido por lei em Myanmar.
O problema não se limita à força oficial em Myanmar, um país governado pelos militares desde 1962 e envolvido na guerra civil em áreas de minorias étnicas desde a sua independência em 1948.
Um relatório das Nações Unidas lançado em Maio mostra a existência de nove grupos armados étnicos no país, assim como o exército do governo, para o recrutamento e utilização de crianças no conflito, observando que "o acesso é extremamente limitado" para monitorar tais forças.
Sein Win, que antes de sua contratação tinha fugido de casa para fugir ao abuso por parte do padrasto, disse que as crianças de rua eram um alvo muito fácil para as tropas do Estado que recebem um pagamento ou recompensa para o preenchimento das quotas militares.
Os soldados vestidos com roupas simples iam ter com as crianças que vivem na rua e diziam: "Ei irmão, queres comer? Eu vou arranjar-te comida".
"As crianças de rua vivem com fome e ficam felizes quando alguém lhes compra algo e seguem esse homem", disse Win Sein.
Steve Marshall, da Organização Internacional do Trabalho (OIT), concordou que as crianças apanhadas "tendem a ser aquelas em situação de vulnerabilidade", como os meninos sozinhos nas estações ferroviárias e mercados. Disse que o menino mais novo conhecido que foi alistado, tinha apenas 11 anos.
A OIT tem um processo para famílias se queixarem sobre casos de recrutamento de menores, que caso se verifique são submetidos ao governo para libertar as crianças e repreender os seus recrutadores.
Desde 2007, mais de 100 vítimas foram libertadas e por outro lado numeroso pessoal do exército repreendido, três dos quais foram presos, havendo treinamento militarde forma a aumentar a consciência do direito de recrutamento.
Mas "não há nenhuma evidência sugerindo que a situação melhorou consideravelmente", disse Marshall.
Os jovens convocados para ajudar no combate a este problema podem enfrentar infâncias destruídas, futuro incerto e, para os desertores como Sein Win, um medo persistente de castigo.
"Eu gostaria de rever a minha mãe e a minha irmã, mas não me atrevo a contactá-las, porque não quero colocá-las em apuros", disse Sein Win. "Também não quero que elas saibam o que passei".
Dos 400.000 soldados no exército, cerca de 70.000 são crianças com menos de 18 anos
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