domingo, 9 de maio de 2010

O Alvoroço da Burka

Texto de Shada Islam

Suponho que deveria estar indignado com a legislação sobre a proibição da burka, recentemente aprovada pelo parlamento belga. Mas a verdade é que não estou - e nem a maioria dos muçulmanos europeus que vêem o assunto como uma distracção do principal desafio da integração económica, política e social do continente europeu com 20 milhões de muçulmanos.  
 
O facto é que a maioria de nós estão verdadeiramente entediados com esta discussão. Há mais na vida dos muçulmanos europeus do que a vestimenta de uma pequena minoria de mulheres muçulmanas que, pelo seu comportamento, são claramente submetidas a um processo triste de auto-isolamento e auto-exílio.  

Na realidade, a burka está no topo da agenda de muitos. Os jornais estão cheios de comentários, reacções e contra-reacções por parte dos jornalistas, políticos, académicos, organizações de direitos humanos, órgãos islâmicos e, claro, a habitual panóplia de governos muçulmanos sempre prontos a denunciar "islamofobia" na Europa.  O debate irá continuar e mais países europeus, incluindo, provavelmente, França, Holanda e Suíça irão adoptar legislação semelhante. 

Nicolas Sarkozy, presidente francês, que tem repetidamente dito que a burka "não é bem-vinda" no seu país, elaborou uma lei que proibe o seu aparecimento em lugares públicos. A Holanda e Itália têm sido empurradas para semelhantes medidas. A ministra alemã Silvana Koch-Mehrin apelou a uma proibição a nível europeu, sobre o uso da burka. "Eu gostaria que na Alemanha, e toda a Europa, se proibisse o uso da burka em todas as suas formas ... a burka é um ataque maciço sobre os direitos das mulheres. É uma prisão móvel", disse ela, acrescentando que o véu completo" apoia abertamente os valores que não compartilham na Europa". Do outro lado do Atlântico, em Quebec no Canadá, parece-se pronto para seguir o exemplo europeu.  

A lei que proíbe o aparecer em público "com o rosto totalmente ou parcialmente coberto  de modo a torná-lo não reconhecível" - fazendo uma excepção para motociclistas que usam capacete – destaca o desconforto de muitos governos europeus sobre a visibilidade do conservadorismo do Islamismo e dos muçulmanos no espaço público. Pessoas apanhadas a usar a burka poderão ser multadas em 15€ a 20€ e, eventualmente, serem presas por uma semana.

Sim, a proibição dá um sinal negativo a muitos muçulmanos europeus sobre o seu papel na sociedade europeia tradicional e cria uma abordagem  "nós” e "eles"  que divide em vez de unir as sociedades europeias.  E sim, a legislação belga realça o poder crescente da extrema-direita em ditar a agenda europeia sobre questões relacionadas com o Islão, a imigração e diversidade.
Sem dúvida, o clima sombrio da economia actual e os temores do desemprego, que dominam a paisagem da Europa e que têm piorado, com queixas de que os 'estrangeiros' estão roubando os empregos aos europeus. Ameaças contra jornalistas e cartunistas sobre a imagem do Islão também despertaram temores de que a religião não é compatível com os valores ocidentais, incluindo a liberdade de expressão.

Na realidade, em termos de impacto a lei só afecta um número extremamente pequeno de mulheres europeias muçulmanas que usam o véu integral. Existem cerca de 375 mil muçulmanas na Bélgica, e acredita-se que apenas algumas dezenas usam a burka. Na França, Alemanha e na Holanda, os números também são muito baixos.

Numa recente conferência organizada em Bruxelas pelo Conselho Britânico e Europeu, a maioria das mulheres muçulmanas europeias deixaram claro que não tinham simpatia por mulheres que vestem burkas. Intelectuais muçulmanas apontaram que não havia textos islâmicos a favor do véu completo, e as mulheres mais jovens - mesmo aquelas que usam véu - denunciaram a burka como estranha e inaceitável na Europa. O consenso geral foi que, em vez de se concentrar sobre os prós e os contras da legislação contra a burka, os governos e os muçulmanos europeus deveriam estar trabalhando numa agenda comum para o diálogo e integração.  

Como uma jovem mulher com um lenço disse na conferência: "Eu não uso o véu para me tornar invisível: eu uso-o para afirmar a minha identidade como muçulmana. Se eu usasse a burka, eu seria realmente invisível  e irrelevante".

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